Sexta-feira de Carnaval, circuito Osmar, entrada de um bloco de samba na Avenida. Dandara sente um abraço por trás e pensa ser de uma amiga. O abraço é insistente, forte, e ela decide olhar para trás. Não era a amiga, sim um completo desconhecido. Começa uma briga com assediador, que corre para longe. No ano em que o assédio passou a ser considerado crime, enquanto a ofensa insiste em se disfarçar de paquera, as mulheres repreendem e reclamam. Cada vez mais alto.
Algo parece estar diferente no Carnaval de Salvador. Pelo menos com as mulheres que frequentam a festa, pois os homens continuam praticamente os mesmos das folias anteriores. Desde o dia 28, um homem foi preso por importunação, segundo a Defensoria Pública do Estado. Com o assédio tratado como crime, elas sentem mais coragem de expor. Mesmo que a exposição não ocorra nos postos policiais onde as ocorrências podem e devem ser registradas, as repreensões estão mais fortes.
Maitê Cristine, 21, amiga de Dandara, começou a pensar se algo de fato está diferente. “Não sei, os puxões de cabelo, as seguradas, aperto de braço, acho que continuam… Tem esses gaiatos que não param”, desconfia Maitê. Aos gaiatos, a diferença entre paquera e assédio é sempre muito clara. Aparentemente, a dúvida já é um indício de um descompasso. E as mulheres estão atentas. Na última terça-feira (26), Léo Santana começava o Pipoca na Barra, quando a amiga de Maíra sentiu um apertão na bunda.
O silêncio, timidamente, quer se tonar exceção. A voz ecoa por todos os lados, inclusive nas plaquinhas, passadeiras e tatuagens provisórias. “Vi muita gente com plaquinha pedido respeito. Não sei se os homens mudaram, mas nós mudamos”, complementa Gabriela Matos, 34, psicóloga. Nenhuma das duas sofreu assédio neste Carnaval. Mas têm certeza do motivo.
Nos braços, estão os recados contra assediadores. Respeite as mina, porque não é não. “Não sofri nada nesse Carnaval. Mas acho que é porque estamos nos empoderando também. Uso isso aqui [o adesivo] também pelas outras mulheres. Nunca é demais reforçar”, afirmou a dentista Daniela Rêgo, 43, no Circuito Osmar.
Todas elas têm em comum, além do medo, um pensamento: não têm certeza se prestariam queixa no posto policial. Como o assédio está longe de existir apenas no Carnaval, embora seja um termômetro dos ânimos, Camila de Jesus, 22, vendedora lembrou do dia em que um desconhecido passou a mão em sua perna, no bairro do Pau Miúdo. Não pôde fazer nada. Agora, que pode denunciar, também não está certa se o faria.
Como denunciar?
É possível denunciar casos de assédio nos postos policiais do circuito. A Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE) também faz plantão de Carnaval, no bairro do Canela (Rua Pedro Lessa, 123).